O AUTO DA COMPADECIDA 2
@farid.cultura
Quando a Globo realizou a minissérie “O Auto da Compadecida”,
em 1999, deu um tiro certeiro. Tudo funcionou muito bem ali, foi um sucesso de
audiência. Em 2000, a obra foi lançada nos cinemas como um longa-metragem e se
transformou num dos maiores sucessos de público do cinema brasileiro. Desde
então, essa adaptação da peça homônima de Ariano Suassuna, acrescida de
elementos de outras obras dele como “Torturas de Um Coração” e “O Santo e a
Porca”, faz a delícia de milhares de fãs, encantados principalmente pelas
peripécias de João Grilo e Chicó, duas das mais fascinantes personagens da
literatura e do teatro brasileiro.
Aguardada com ansiedade e baseada numa grande campanha
publicitária, chegou aos cinemas nesta semana a continuação do filme de 2000,
agora chamada “O Auto da Compadecida 2”. Fui conferir logo na estreia e tenho
algumas considerações a fazer:
1-
Já
se disse muito que não há como fazer comparação com o original, mas isso é
inevitável. O público que ama o primeiro filme vai ao cinema ansioso pelo
reencontro com as personagens inesquecíveis que aprendeu a amar. O reencontro
com João Grilo e Chicó, com os mesmos Matheus Nachtergaele e Selton Mello,
acontece e é bem-vindo. Os dois são maravilhosos e trazem de volta o prazer de
ver as histórias dessa dupla de amigos, com suas costumeiras trapalhadas e
confusões na mesma Taperoá, a pequena cidade que é palco de suas aventuras.
2-
O
mesmo público que se encanta com João Grilo e Chicó não terá a mesma satisfação
com as outras personagens, ou a falta delas. Não há aqui Lima Duarte e seu
Bispo, nem o Padre João de Rogério Cardoso, nem o Capitão Severino de Marco
Nanini, só para citar algumas interpretações antológicas. E por mais que Taís Araújo
dê leveza e graça à sua Nossa Senhora, impossível não sentir a falta da
monumental Fernanda Montenegro.
3-
Reconheço
o dificílimo trabalho de continuar a escrever falas para João Grilo e Chicó,
quando Ariano Suassuna não está mais entre nós. O resultado é um tanto
decepcionante, mas a força dos atores compensa os problemas.
4-
Virgínia
Cavendish permanece como Rosinha nesta continuação, Enrique Diaz também está
presente como Joaquim Brejeiro, e novas personagens surgem, como Clarabela,
vivida por Fabíula Nascimento, o coronel Ernani (Humberto Martins) e o
radialista Arlindo (Eduardo Sterblich), além do ótimo Luís Miranda,
interpretando o malandro carioca Antonio do Amor que, a pedido de João Grilo, se
faz passar pelo Bispo, numa criação realmente hilária.
5-
Visualmente
“O Auto da Compadecida 2” é bonito, tem
efeitos visuais competentes, mas sua trilha sonora, com a inclusão de algumas
canções conhecidas causa um
estranhamento, como “Canção da América”, de Milton Nascimento, para acentuar o
valor da amizade entre João Grilo e Chicó, e a romântica “Como Vai Você”, de
Antonio e Mário Marcos, com Chico César
, para dar ênfase ao amor entre Chicó e Rosinha ...e mesmo quando entra a voz sublime
de Maria Bethânia cantando “Fiadeira”, a música parece um pouco deslocada da
trilha original de João Falcão e Ricco Viana.
6-
Guel
Arraes é um diretor cuidadoso e, aqui, demonstra coragem. Seu roteiro, em
parceria com João Falcão, Adriana Falcão e Jorge Furtado, ao criar novas
situações para João Grilo e Chicó, até chegar ao aguardado segundo julgamento
de João Grilo, é um exercício de superação das dificuldades naturais de
continuar um filme cuja base sólida foi o texto de Suassuna.
7-
Sobre
o novo julgamento, aliás, ponto positivo para a ousadia de colocar Matheus
Nachtergaele como João Grilo e também como o Demônio e Jesus Cristo. O ator,
realmente, é de um talento absoluto.
Num ano em que o nosso cinema ganha
visibilidade mundial por causa do sucesso de “Ainda Estou Aqui”, é alentador
saber que “O Auto da Compadecida 2” levará muita gente aos cinemas para ver
mais um filme brasileiro.
O AUTO DA COMPADECIDA 2 – Direção de
Guel Arraes e Flávia Lacerda - em cartaz nos cinemas
Cotação: ***BOM
Comentários
Compartilhe esta notícia
Faça login para participar dos comentários
Fazer Login