
Sedentarismo e telas têm levado à perda de força muscular infantil
A
pandemia de covid-19 acentuou um problema silencioso que vem se agravando entre
as novas gerações: a perda de força muscular entre crianças, conhecida no meio
científico como dinapenia infantil. Antes restrita a idosos, essa condição tem
sido observada com maior frequência na infância, resultado direto da queda nos
níveis de atividade física e do aumento do tempo de tela durante os últimos
anos. Essa é a principal conclusão de um estudo conduzido pelo educador físico
e pós-doutorando do Instituto de Física Gleb Wataghin (IFGW) da Unicamp, Cássio
Victora Ruas, em parceria com pesquisadores da Universidade Federal do Rio
Grande do Sul (UFRGS), Austrália e França.
Segundo
Ruas, as crianças de hoje estão mais sedentárias e fisicamente inativas do que
as de gerações anteriores. “Há décadas observamos a redução da atividade física
entre crianças e adolescentes. Como consequência, as gerações atuais são mais
fracas, têm menor resistência e enfrentam problemas que antes eram típicos da
velhice”, explica. Para ele, a musculatura infantil precisa de atenção urgente,
pois está diretamente ligada à capacidade motora, equilíbrio, postura e saúde a
longo prazo.
O
estudo sugere que é possível reverter esse cenário com exercícios de força
voltados especificamente para o público infantil. O tipo de treino proposto é o
exercício excêntrico, que promove o fortalecimento muscular por meio do
alongamento ativo do músculo, com destaque para movimentos de desaceleração –
como o controle ao descer uma escada ou ao realizar um agachamento de forma
lenta. Em ambientes de academia, ele pode ser observado em exercícios com
halteres na fase descendente do movimento, por exemplo.
Apesar
de envolver práticas comuns ao universo adulto, como musculação e uso de
equipamentos, os exercícios recomendados para crianças podem (e devem) ser
adaptados ao universo lúdico e pedagógico. Ruas destaca a importância de
atividades integrativas e criativas, principalmente para crianças antes da
puberdade. “Saltos imitando animais, rastejos como cobras, corridas curtas,
desafios em estações com agachamentos e movimentos de tração são excelentes
formas de estimular a força muscular de maneira divertida e segura”, afirma.
De
acordo com o pesquisador, os benefícios do treinamento de força vão além da
estética ou da melhora no desempenho físico. “A força muscular é a base de todo
movimento humano. Ela é necessária para correr, pular, se levantar, empurrar,
agachar, ou mesmo realizar atividades cotidianas. Crianças naturalmente são
curiosas e se movimentam com frequência, mas com o uso excessivo de telas,
muitas deixaram de explorar esse potencial”, aponta.
A
segurança da musculação infantil, por muitos anos questionada, já é amplamente
reconhecida pela ciência. Pesquisas recentes mostram que o treinamento de força
pode ser aplicado em crianças de todas as idades, desde que haja supervisão
adequada. Ruas recomenda que os exercícios sejam acompanhados por profissionais
qualificados, com uma média de dois supervisores por criança em atividades mais
complexas.
A
pesquisa conta também com a colaboração da pediatra Flávia Meyer, professora
aposentada da UFRGS, que há décadas estuda os efeitos positivos da atividade
física em crianças. A parceria com Ruas foi impulsionada pelas observações
feitas durante a pandemia e levou à formulação de propostas que visam a
implantação de políticas públicas voltadas à prevenção e tratamento da
dinapenia infantil. As propostas incluem a implementação de programas de
atividade física em escolas e projetos sociais, além de capacitação para
professores de educação física e integração com a classe médica.
“Nós
acreditamos que o conhecimento dos educadores físicos pode se unir ao saber da
medicina para melhorar a performance e a saúde das crianças. Com a orientação
correta, o exercício se torna não apenas eficaz, mas também seguro. E isso é
fundamental para combater o sedentarismo, a obesidade e os problemas
musculoesqueléticos que já começam a surgir na infância”, defende Ruas. (Com
Unicamp)
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