
Gilson, Júlio e a samaritana
Uma das passagens que mais me
encanta na Bíblia é o diálogo de Jesus e a samaritana. Encontra-se no Evangelho
de João, capítulo 4, versículos 1 a 42. Ali o mestre nos diz muito, não só nas
suas palavras descritas pelo evangelista que relata o que viu e ouviu com seus
próprios olhos e ouvidos, mas em suas ações.
Jesus conversa com a mulher
samaritana, algo incomum na época devido às diferenças culturais e religiosas
entre judeus e samaritanos, além de o fato de ela ser mulher. Na época, era
incomum um homem judeu conversar com uma mulher, especialmente uma samaritana,
em público. Esse diálogo quebra normas sociais e religiosas. A rivalidade entre
essas comunidades remonta à época da conquista assíria, quando os samaritanos
foram considerados "misturados" devido à colonização e casamentos
interétnicos. Isso gerou preconceitos e tensões que persistiram por séculos.
Isso demonstra a abertura de
Jesus para alcançar todas as pessoas, independentemente de sua origem ou
história.
A mulher está retirando água de
um poço chamado Poço de Jacó. O poço, localizado em Sicar (atual Nablus, na
Cisjordânia), é um marco histórico e simbólico. Ele remonta aos tempos do Antigo
Testamento e era um local de importância tanto prática quanto espiritual. Segundo
a tradição, o poço foi escavado por Jacó e foi uma importante fonte de água
para a região. Ao longo dos séculos, ele se tornou um local de veneração e foi
incorporado a diferentes construções religiosas, como igrejas e mosteiros.
Por volta do meio-dia, a mulher
encontrava-se a beira do poço, um horário incomum para buscar água, pois era o
momento mais quente do dia. Tradicionalmente, as mulheres da época buscavam
água pela manhã ou no fim da tarde, quando a temperatura era mais amena. O fato
de ela estar ali naquele horário sugere que ela poderia estar evitando a
presença de outras pessoas, talvez devido à sua condição social ou sua história
de vida, mencionada no diálogo com Jesus. Ela menciona que haverá tido cinco
maridos e que vivia com um sexto homem.
Essa escolha de horário pode
indicar que ela enfrentava algum tipo de julgamento ou exclusão em sua
comunidade. Esse contexto enriquece ainda mais o impacto do encontro com Jesus,
que a acolhe sem preconceitos. Isso a torna uma testemunha poderosa para sua
cidade.
Então temos o Rei nos mostrando
através de seu comportamento uma das suas maiores lições. Ele conversa com uma
mulher a quem a comunidade exclui. Ele pede água a ela, o mestre tem sede e
aceita a água vinda das mãos dela que é rechaçada pelos seus.
Jesus Cristo não julgou um só ser
em sua passagem pela terra e, mesmo assim, nós que nos dispusemos a segui-lo
enfrentamos batalhas internas severas para tentar – na maioria das vezes sem
sucesso – não julgar, não julgar a quem quer que seja.
Ali naquele diálogo Jesus diz à
mulher que a conhece, que a acolhe e oferece seu caminho como verdade: a água
viva.
Jesus não é somente para judeus,
mas também para samaritanos e para todos – para todos!
Qualquer movimento de exclusão
vai contra as palavras e ações do Cristo e naquele diálogo ele ainda ensina que
não há um local específico ou exclusivo para orar ao Pai. Isso exclui qualquer
discurso de que será no templo tal ou na igreja tal o único lugar para falar
com Deus.
Tão difícil é entender por que
ainda é comum a utilização do nome de Jesus para fins de segregação e de
condenação.
Ele que não condenou uma só
criatura e que perdoou quem o matava na cruz é utilizado como arma para que nós
anulemos a existência do outro, para que imponhamos nossos valores e nossas
verdades relativas, para que condenemos o outro ao fogo do inferno e sintamos,
somente nós, dignos das misericórdias divinas.
Jesus é Deus e Deus nos ensina
ali que enxerga cada um de nós além das aparências e que quer nos alcançar
independente das circunstâncias em que nos encontremos.
Jesus de Nazaré: a figura
histórica mais importante que já esteve neste planeta – e veja que essa
afirmação é aceita também pelos não cristãos e pelos ateus – não se deu ao
trabalho de julgar e nada se importava com quem o julgasse. A condenação não o
atingiu, o mestre vive e seu legado sobrevive aos que julgam os que acordam na
madrugada para rezar e aos que julgam os que alimentam diariamente aos que tem
fome.
Se você chegou até aqui, caro
leitor, entenda que Jesus é para todos.
Eu conheço um sacerdote jesuíta
que dedica a sua vida a alimentar e ao cuidar dos famintos, maltrapilhos e
drogadictos que nos causam ojeriza ao perambular feito zumbis pelo centro de
São Paulo. Eu conheço também um frei carmelita e sacerdote que desde deis mil e
vinte reza o Santo Rosário na madrugada, ambos são pregadores do evangelho de
Cristo e ambos são seguidos em seu trabalho apostólico por milhões de fiéis.
Quando eles consagram o pão e o
vinho, Jesus se faz presente. Não faz diferença alguma se você assistir a uma
Santa Missa presidida por um ou por outro: Jesus estará presente. Cuidemos para
que nossas pedras não atinjam ao Rei dos Reis, presente no trabalho de ambos.
Jesus é para todos!
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