
A Vida de Chuck : mistério, delicadeza e poesia vindos de um conto de Stephen King
Por Farid Zaine
@farid.cultura
farid.cultura@uol.com.br
“Eu sou vasto, eu contenho multidões”, verso do famoso poema
“Song of Myself” (Canção de Mim Mesmo), de Walt Whitman, citado no filme “A
Vida de Chuck”, fará todo o sentido ao longo da história. Como é baseado num
conto de Stephen King, “A Vida de Chuck” pode sugerir, aos fãs do gênero
cultivado pelo autor, lido em todo o planeta, que se trata de um pesado filme
de terror e mistério. Se o interessado olhar a ficha técnica, vai ver também
que o diretor é Mike Flanagan, diretor da série de sucesso da Netflix, “Missa
da Meia-Noite”, que é sensacional. Mas “A Vida de Chuck” mostra o outro lado de
Stephen King, mais sutil, mais poético, embora levado com uma mistura de melancolia
e tristeza, sem dispensar a beleza e a alegria. Da mesma forma, Flanagan também
tem a chance de mostrar outra face de seu talento. O diretor e roteirista de filmes e séries de
sucesso, tensos e pesados, leva para a tela o conto de King com a delicadeza
necessária, sem abrir mão de deixar o público cheio de questionamentos e
reflexões.
A história em “A Vida de Chuck” é a de Charles “Chuck”
Krantz, de quem não sabemos nada no começo do filme, apenas o vemos em outdoors
que agradecem pelos seus 39 anos de vida; o filme é dividido em três atos, e
começa pelo terceiro, que é o mais sombrio e melancólico de todos; nele,
ficamos sabendo que o universo, provavelmente, está chegando ao fim. Todo esse
terceiro ato tem longos diálogos em que se sobressai uma interessante e
complicada explicação matemática sobe o nascimento e a morte do universo. A matemática,
aliás, surge todo o tempo, e em um dos momentos mais interessantes sobre o
assunto, quem dá conta do recado é o Mark Hamill, excelente no papel do avô de
Chuck. Hamill, o eterno Luke Skywalker de “Star Wars”, tem aqui o
reconhecimento da crítica por sua brilhante performance.
É no segundo ato que teremos a presença mais constante do
protagonista, um trabalho excepcional de Tom Hiddleston no papel de Chuck
adulto. Em cena já antológica, a personagem, Chuck , caminha carregando uma
pasta, vestido como um sério profissional de contabilidade, quando se depara
com uma baterista de rua, Taylor (Taylor Gordon), tocando para ganhar uns trocados, e passa a
dançar; forma-se rapidamente uma plateia que se envolve no ritmo, e ele convida
uma mulher, Janice (Annalise Basso), para dançar com ele. A coreografia que se
vê a seguir é belíssima, muito bem marcada e mostra todo o talento e a
desenvoltura do casal, principalmente pelo show de competência de Hiddleston.
Cena inesquecível e fundamental para a compreensão da história.
O último ato do filme, o primeiro ato, vindo na ordem
cronológica inversa, mostra mais a infância de Chuck, seu relacionamento com o
avô, suas descobertas e o desenvolvimento do seu talento para a dança, “pura
matemática”, nas palavras do avô.
“A Vida de Chuck” é um convite a uma viagem para dentro de
cada um de nós, para uma revisão de todos os atos que vivemos durante a nossa
existência, e das coisas que acontecem conosco e com as pessoas com quem
convivemos. Além disso, é um mergulho sobre o universo e seus significados,
sobretudo sobre a possibilidade de sua finitude.
“A Vida de Chuck” é uma linda leitura do conto de Stephen
King levada com delicadeza e bom gosto por Mike Flanagan, com um elenco
primoroso, trilha sonora perfeita e coreografias que caberiam em um ótimo
musical. Uma mistura que envolve a precisão da ciência, as alegrias e os
percalços da vida, além dos profundos e complexos mistérios em que mergulhamos
ao pensar no nascimento do universo e a permanente sombra da ameaça do seu
desaparecimento.
A Vida de Chuck (EUA, 2024) – Com Tom Hiddleston, Chewetel
Ejiofor ,Mark Hamill, Karen Gillan e grande elenco – direção de Mike Flanagan –
em cartaz nos cinemas.
Cotação: *****ÓTIMO
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