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HapVida: mães revelam negligência para atendimento de filhos autistas

Sete mães tiveram negadas sessões de terapia para os filhos e registraram boletim de ocorrência; Comissão da OAB fez nota de repúdio e pretende levar ao MP

 

Uma denúncia contra a operadora de saúde Hapvida ganhou destaque após mães relatarem o descaso no atendimento de crianças com Transtorno do Espectro Autista (TEA). O assunto ainda gerou uma carta de repúdio lida ontem durante a sessão ordinária da Câmara de Limeira.

Entre as queixas, uma mãe, cujo filho de 6 anos, Caio, foi diagnosticado com TEA nível 3, desabafou sobre os problemas enfrentados desde a transição da Medical para a Hapvida. Ela e mais seis mães registraram um boletim de ocorrência e pediram ajuda para a Comissão da OAB na Câmara Municipal.

Segundo Maisa Regina Pires de Moraes, seu filho Caio realiza terapias desde um ano e oito meses e necessita de 40 horas semanais de atendimento, incluindo psicologia e ABA (Análise do Comportamento Aplicada). No entanto, desde a mudança para a Hapvida, a família tem enfrentado dificuldades constantes, incluindo tentativas de cancelamento de atendimentos.

No último dia 8 de fevereiro, a mãe foi surpreendida com a informação de que o número de atendimentos para seu filho seria reduzido drasticamente, de maneira unilateral e sem aviso prévio. Outras mães relataram ter passado pela mesma situação, sendo avisadas pelas profissionais responsáveis pelo atendimento de seus filhos.

“Depois que houve a transição da Medical para a Hapvida sempre tivemos problemas. Meu filho era de outra clínica e por vezes tinha que fazer reclamação no SAC porque eles queriam cancelar atendimentos. Como o autismo do Caio é severo ele tem uma carga de 40 horas semanais que com muito custo consegui que fosse cumprida”, disse em entrevista para a Gazeta.

Ao buscar explicações na recepção da clínica em Limeira, as mães foram surpreendidas com a indisponibilidade de atendimento por parte da direção ou serviço social. O momento atingiu um ponto crítico quando acionaram a polícia militar para intermediar a situação. “A recepcionista Gisele informou que alguém desceria para falar em 15 minutos, mas esse prazo não foi cumprido”, disse.

Durante a espera, a situação se agravou quando Caio se soltou e correu em direção à rua, por sorte sem incidentes graves. “Graças a Deus ele não foi atropelado. Outra mãe entrou e implorou por atendimento, mas uma funcionária e um segurança falaram que ninguém mais iria descer para falar com a gente e ficaram rindo e debochando de nós. Foi muito humilhante”, disse.

As mães alegam que insistiram por explicações. “Os policiais presentes nos orientaram a registrar um boletim de ocorrência”, disse. “Então na hora que a polícia chegou uns minutos depois a psicóloga entrou em contato informando que os atendimentos estavam normalizados, mas mesmo assim fomos fazer o boletim e mais uma vez não avisaram nenhuma mãe”, disse.

Jacqueline Capelatto também relatou os principais desafios que enfrenta ao buscar tratamento para seu filho no plano de saúde Hapvida. “A maior dificuldade é o plano médico liberar as terapias. Sempre tem empecilho,querendo questionar laudo médico, obrigando à passar em clínicas não especializadas e com profissionais que não tem formação pedida pelo médico. Sendo resolvidas com aberturas de reclamações na ANS, com advogados e boletim de ocorrência”, relata.

Para ela, a transição foi péssima. “Com a Medical era muito mais fácil a liberação de terapias e problemas eram resolvidos com a administração. Agora eles empurram para vários canais e ninguém resolve. Não conseguimos atendimento bom e de qualidade! O plano não oferece isso. Temos o desafio de buscar fora da rede conveniada e com isso surge o problema com a liberação de plano. Precisamos sempre passar com neuropediatra e o que não há pelo convênio, não conseguimos reembolso. O médico que atende pelo convênio como neuropediatra no Cremesp só consta o registro de pediatra como especialidade”, relata.

Ela ainda faz um desabafo sobre os desafios enfrentados, já que muitas mães compartilham suas lutas e triunfos similares. “A família de uma criança atípica é muito desrespeitada e desacreditada! Todos os dias precisamos brigar para que os diretos de nossos filhos sejam respeitados”, afirma.

Em nota para a Gazeta, a Hapvida informou que reitera seu compromisso em oferecer o melhor atendimento aos clientes, incluindo assistência necessária e acolhimento aos familiares. “Em casos específicos, busca alternativas para atender às necessidades individuais dos pacientes, respeitando as normativas da ANS. Estamos à disposição, reforçando nosso compromisso com a qualidade, acolhimento e eficiência no atendimento aos nossos clientes”, destaca.

 

“Caso não é isolado”, diz advogada

Para a presidente da Comissão de Direito da Pessoa com Deficiência Aparente e não Aparente da OAB Subseção Limeira, Erika Cristina Filier, o caso levanta questionamentos sobre a qualidade do atendimento oferecido pela Hapvida a pacientes com TEA e coloca em foco a importância de garantir tratamentos adequados. “Um plano que atende mais de 15 milhões de usuários no país, que carece de um atendimento mais humanizado e que não respeita seus clientes. Essa é a Hapvida”, relata a advogada em entrevista.

Erika também relatou que foi procurada por essas mães e que o caso não é isolado. “Imaginem quantas mães desconhecem de seus direitos, mesmo em serviços particulares? São famílias que já enfrentam dificuldades, principalmente por falta de acesso a diversos setores”, afirma. Ela destacou ainda que há diversos processos movidos contra a instituição.

Com o apoio da Comissão de Saúde, a presidente da Comissão da OAB usou a Tribuna Livre na noite de ontem onde leu uma carta de repúdio contra a operadora de saúde, falando sobre o descaso da empresa com os usuários do convênio Hapvida.Além de encaminhar um ofício à Hapvida para que se manifeste sobre o caso relatado por Cristina, a Comissão de Saúde da Câmara se propôs na semana passada a realizar uma ação conjunta com o Ministério Público para buscar uma solução concreta.

 

Em nota, Comissão da OAB destaca “atendimento desumano”


A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) Subseção Limeira, por meio de suas Comissões de Direito da Pessoa com Deficiência Aparente e Não Aparente, e de Direito Médico e Odontológico, emite uma nota de repúdio à conduta da empresa Hapvida Assistência Médica S/A em Limeira, no Estado de São Paulo, e em todo o Brasil. A entidade expressou sua total indignação com o atendimento considerado desumano, ineficaz e negligente oferecido pela empresa, afetando colaboradores e usuários, especialmente aqueles com transtorno do espectro autista (TEA).

“Nossa intenção através desta nota é registrar nossa total indignação pela forma de atendimento adotada por esta empresa, desde alto escalão que a administra, e que, consequentemente se reflete em cadeia, através de suas unidades, afetando inclusive seus colaboradores e por fim os usuários que, embora, pagantes, convivem rotineiramente, com atendimento que denominamos desumano, ineficaz, imperito, negligente e propositalmente, insensível”, disse.

A nota ainda citou o ocorrido no dia 8 de fevereiro. “A empresa HAPVIDA fere a Resolução Normativa nº 539/2022 da Agência Nacional de Saúde Suplementar a qual torna obrigatória a cobertura de sessões com psicólogos, terapeutas ocupacionais e fonoaudiólogos, para o tratamento/manejo dos beneficiários portadores de transtorno do espectro autista e outros transtornos globais do desenvolvimento, pelos fatos ocorridos manifestamos nossa solidariedade às famílias das pessoas autistas”, explica.

A Comissão ainda destacou o Sistema Integrado de Atendimento, que substituiu o contato humano por tecnologia. “Os usuários, ainda que mais esclarecidos não conseguem resolver suas demandas, não conseguem obter por escrito e formalmente suas negativas e quiçá seus tratamentos”, disse.

A nota ainda enfatiza que a empresa Hapvida não se intimida nem mesmo quando, por decisão judicial é determinado que assista o usuário de acordo com o contrato firmado. “Diante deste cenário, nos vemos na obrigação moral de dar voz a estas 15.800.000 pessoas lesadas em seus direitos essenciais. Espera-se que, sendo a Hapvida a prestadora de serviços que assiste também os servidores públicos deste município, explorando seu comércio de planos de saúde através dos cidadãos representados por esta Casa de Leis, seja alvo de repúdio também de Vossas Senhorias, inclusive com maior rigor e empenho nas Comissões Parlamentares de Inquérito que porventura tramitam, para que se apure e defenda, não apenas o direito de um, mas o interesse coletivo”, finaliza.

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