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“Isso é mais uma deturpação de ritos que existem em alguns terreiros”

A Polícia segue investigando o crime que ocorreu no fim de semana e que vitimou o adolescente de 16 anos, Erick Delatore de Araújo, morto a facadas em uma área verde de difícil acesso, ao lado da Fazenda Arizona.  Frequentando o mesmo centro religioso que o criminoso, Erick foi atraído ao local para realizar um ritual religioso.

O réu confesso teria dito que ambos “fechariam seus corpos”, mas eles começaram a discutir e, como estava armado de faca, resolveu atacar a vítima. Alguns pontos precisam esclarecidos, mas o fato vem gerando repercussão principalmente por se tratar de uma questão religiosa. “O ‘fechamento de corpo’ é um rito de proteção espiritual, praticado pelo Candomblé de Angola às Sextas-feiras Santas, e tem por objetivo "proteger" uma pessoa de ataques espirituais e não ataques por arma de fogo ou arma branca como alguns acreditam. Esse ritual não pode ser feito por pessoa despreparada ou não legalizada na religião”, destaca o Pai Zezinho, da Casa de Ègbè Òmò Logunbiyi, que é uma das mais antigas e respeitadas em Limeira.

Em entrevista para a Gazeta, o Babalorixá esclareceu que não conhece o terreiro que o jovem frequentava e explicou as principais diferenças entre Umbanda e Candomblé. Ele também destacou a intolerância religiosa praticada por quem não conhece as religiões de matriz africana. “Esse crime preocupa muito os verdadeiros Sacerdotes e Sacerdotizas, pois é mais uma deturpação de ritos que existem em alguns terreiros, mas que não envolvem atrocidades e sim fé e proteção”, destacou.

O Candomblé é uma religião que existe há 5.000 anos, é oriunda da África e cultua Orixás, que são como Ministros de Deus (Olodunmare) e regem os elementos da Natureza (água, terra, fogo e ar). “É uma religião extensa e complexa em sabedoria, prega o bom caráter, a conduta ilibada, a obediência as Leis de Deus e tem rituais específicos e seguidos por esses Sacerdotes e Sacerdotizas que devem ter uma linhagem de "familia espiritual" que remete aos Templos e Casas Matrizes da Bahia, Recife e Maranhão, fundadas por escravos cerca de 200 anos atrás no Brasil”, destaca.

Já a Umbanda é uma religião brasileira, nascida no Rio de Janeiro há 110 anos e cultua espíritos desencarnados que são chamados "guias espirituais". “A Umbanda nasceu de uma mistura de crenças como o cristianismo, o Candomblé, o Kardecismo, a Pajelança e seus dirigentes na origem são chamados de Padrinhos de Umbanda ou Madrinhas de Umbanda, é uma religião digamos irmã do Candomblé, mas completamente diferente em seus ritos, as duas são religiões que quando praticadas por quem entende a espiritualidade, são legais, reconhecidas e sérias”, explica.

Para Zezinho, a intolerância com as religiões de matriz africana vem do preconceito racial. “Não se pode negar que o preconceito contra negros e seus descendentes existe, é um preconceito estrutural e fomos e somos ainda muito atacados por outras religiões por vários motivos. Alguns desses motivos é realmente o desconhecimento, a ignorância de muitas pessoas sobre religiões que não entendem. Dessa falta de esclarecimento nasce também uma espécie de medo, justamente por associarem nossas religiões como cultuadores de demônios, sendo que para o Candomblé em específico o demônio não existe, não existe a figura do Diabo em nossa religião”, explica.

Ele ainda destacou que o preconceito existe por conta de "Falsos Pais e Mães de Santo". “Existem charlatões que estão por aí abrindo Casa para exploração da fé alheia. São lugares onde geralmente são ingeridas bebidas alcoólicas e muitos deles até drogas ilícitas, além de abusos com seguidores incautos. Eles simplesmente abrem um terreiro sem legalidade nenhuma, pois toda religião inclusive a nossa, para ter um Templo aberto, precisa de documentação legal, CNPJ e toda uma estrutura para serem Templos reconhecidos, mas a fiscalização por parte das autoridades não existe e essa ilegalidade se torna um terreno fértil para o que temos visto em Limeira e no Brasil todo, ou seja, atrocidades, assassinatos, abusos sexuais, e orientações que levam seus seguidores a se destruírem”, destacou.

O líder espiritual repudiou o crime ocorrido neste final de semana em Limeira. “Para mim está mal esclarecido ainda. Um rapaz de 20 anos jamais poderia ser dirigente ou ter qualquer conhecimento para fazer qualquer ritual do Candomblé ou Umbanda, pois é muito jovem e não teria aprendido ainda o suficiente para fazer qualquer rito que me parece ser da Umbanda. Isso preocupa muito os verdadeiros Sacerdotes e Sacerdotizas, pois é mais uma deturpação de ritos que existem em alguns terreiros, mas que não envolvem atrocidades e sim fé e proteção”, disse.

A origem de um verdadeiro Pai de Santo do Candomblé acontece na sua iniciação e se segue com aprendizado e estudos diários sobre a religião. “Não é qualquer pessoa que dentro da religião tem direito de abrir uma casa, ele precisa ser apontado pelos Orixás como um Sacerdote e passa por ritos específicos e aprendizado constante para ser um Pai de Santo. Um conselho e sugestão para quem procura se cuidar dentro da espiritualidade do Candomblé e da Umbanda é que se conheça onde você está entrando para uma consulta espiritual, saber se ali realmente é um Templo de Respeito, quem é o Dirigente ou Pai de Santo, se ele tem legitimidade e procedência dentro da religião, se o Templo ou Casa é sério e se é legalizado junto ao Governo”, aconselha.

Em Limeira, Pai Zezinho destaca que existem Templos e Terreiros sérios, tanto do Candomblé como da Umbanda. “Existem Sacerdotes e Sacerdotizas sérios, conscientes da sua missão de praticar o bem e levar seus seguidores e viverem dentro do que manda uma religião séria espiritualista, mas infelizmente vejo que existem muitos outros que não são capazes, não são legalizados e não tem sabedoria nem conhecimento necessário a qualquer Sacerdote de qualquer religião”, afirma.

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