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‘Uso de patente: para cada empresa há uma estratégia a ser pensada’

 

 

Especialista na área de propriedade intelectual fala sobre os direitos do inventor e estratégias no uso de patentes

 

 

 

Patentes, como obtê-las e estratégias para o uso delas estão entre os tópicos abordados na entrevista com o advogado Paulo Daniel Cicolin neste Fato & Versão. O especialista explica sobre os termos e deixa orientações a empresas e inventores.

Cicolin é sócio do escritório Kube Cicolin Advogados, com mais de 10 anos de experiência nas áreas de propriedade intelectual, societário, contratos e imobiliário. Especialista em Relações Internacionais pela FESPSP e Direito Digital pelo IBMEC. Membro da Comissão de Estudos de Startups da OAB de Campinas/SP e da Comissão Estadual de Propriedade Intelectual da OAB/SP. Atualmente, cursa Mestrado Profissional em Propriedade Intelectual e Inovação pela Academia do INPI – Instituto Nacional de Propriedade Industrial.

 

O que é patente?

A patente é um privilégio concedido pelo Estado a um inventor para que ele possa explorar sua invenção com exclusividade pelo período de 20 ou 15 anos, a depender do tipo de invenção, se Patente de Invenção ou Modelo de Utilidade. A primeira lei sobre patentes remonta ao século XV, em Veneza, mas é a partir da revolução industrial que o instituto se aperfeiçoa, com as primeiras convenções internacionais sobre propriedade intelectual sendo realizadas em Paris, em 1883. Contudo, é a partir da criação da Organização Mundial do Comércio, a partir da Rodada Uruguai em 1993, que a propriedade intelectual passa a se apresentar de maneira mais uniforme entre os países signatários do Acordo TRIPs, acrônimo em inglês para Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados ao Comércio. O Brasil foi signatário desse acordo, o que o levou a atualizar a legislação com a publicação da Lei nº 9.279/96 (Lei de Propriedade Industrial - LPI), que está vigente até hoje e regula a concessão e proteção das patentes, marcas, desenhos industriais e indicações geográficas. A Lei também diz o que não são patentes: descobertas e teorias científicas; concepções puramente abstratas; regras de jogo; procedimentos terapêuticos e cirúrgicos, entre outros.

 

Quais são os direitos do inventor?

Nem sempre o inventor será o próprio titular da patente, pois eles podem ser duas pessoas distintas. Imagine o caso hipotético em que um funcionário invente algo para uma empresa, sua empregadora. Esse funcionário será o inventor e a empresa será a titular dos direitos sobre a patente. Essas figuras são definidas no momento do pedido junto ao INPI, pois a carta patente é concedida ao titular, embora o nome do inventor conste no referido documento. Ao titular da patente, portanto, é conferido o direito de impedir terceiro, sem o seu consentimento, de produzir, usar, colocar à venda, vender ou importar com estes propósitos produtos objeto de patente ou processo ou produto obtido diretamente por processo patenteado. Além disso, é assegurado ao titular da patente obter uma indenização pelos prejuízos causados pela violação de seu privilégio. Por outro lado, aquele que usa ou explora indevidamente uma patente, comete crime de acordo com a Lei de Propriedade Industrial.

 

Estratégias para exploração da patente?

As estratégias para uso e exploração de patente variam de acordo com as necessidades e realidades do titular e devem estar alinhadas com o planejamento estratégico da própria empresa, no caso de ela ser a titular, por exemplo. O primeiro passo é compreender se realmente é possível ou necessário ter uma patente, seja ela de invenção ou modelo de utilidade. Se optarem pela estratégia de uso e exploração da patente, é possível usar com exclusividade aquela determinada invenção ou mesmo licenciá-la para terceiros. Há empresas, por exemplo, que se especializam em licenciarem suas tecnologias para recebimentos de royalties, que são reaplicados em pesquisa e inovação para desenvolvimento de novas tecnologias. Há outras empresas que usam as patentes para impedir que seus concorrentes acessem as tecnologias de ponta, com o objetivo de mantê-los sempre abaixo das tecnologias oferecidas por elas. Assim, para cada empresa há uma estratégia a ser pensada para obter o melhor resultado com a patente.

 

Quais os requisitos para concessão da patente?

Os requisitos para a concessão de patente variam de acordo com o tipo solicitado: Patente de Invenção ou Modelo de Utilidade. Para o primeiro, é necessário que a invenção atenda aos requisitos de novidade, atividade inventiva e aplicação industrial (art. 8º, da LPI). No segundo, é patenteável como Modelo de Utilidade o objeto de uso prático, com aplicabilidade industrial e que apresente nova forma ou disposição, desde que envolva um ato inventivo e que esta invenção resulte numa melhoria de uso ou fabricação (art. 9º, da LPI). Tanto a Patente de Invenção quanto o Modelo de Utilidade são considerados novos quando não compreendidos no estado da técnica, ou seja, a invenção precisa superar aquilo que já é de conhecimento público no Brasil ou no Exterior. A aplicabilidade industrial significa que aquela invenção pode ser facilmente replicada em qualquer tipo de indústria. Por fim, os atos de invenção, isto é, os esforços dispendidos pelo inventor para criar algo novo, ocorrem sempre que isso não seja comum para um técnico no assunto. No caso da Patente de Invenção, a proteção também pode recair sobre um determinado processo industrial, como, por exemplo, processo de fabricação de cerveja; processo de extração de azeite de oliva, entre outros e desde que, obviamente, obedeça aos requisitos de novidade, aplicação industrial e atividade inventiva.

 

Onde e como solicitar a concessão da patente?

No Brasil, a autoridade responsável em analisar e conceder os pedidos de propriedade industrial é o INPI – Instituto Nacional de Propriedade Industrial. Há a possibilidade de requerer a proteção em outros países, via Organização Mundial de Propriedade Industrial, mas é um procedimento mais específico e adotado, em regra, por grandes corporações, dado o alto valor do investimento. No Brasil, há um incentivo financeiro para pessoas físicas, microempreendedores individuais, microempresas e empresas de pequeno porte, que pagam valores menores durante todo o procedimento. Hoje para um destes efetuar o depósito do pedido de patente no INPI, o valor da taxa é de R$ 70,00 (setenta reais). O procedimento perante o INPI é todo eletrônico, sendo necessário elaborar um requerimento em que conste um resumo, um relatório descritivo, as reivindicações e, se houver, a apresentação de figuras. No relatório descritivo deve-se descrever o que é, o que faz, como faz e por que ela é diferente (nova) em relação àquilo que já existe no estado da técnica. É importante que este tópico seja bem detalhado, para possibilitar que o examinador do INPI possa replicar os conceitos ali descritos para compreender se a invenção preenche os requisitos de patenteabilidade. No entanto, são as reivindicações que garantem a proteção da patente e sua extensão. As reivindicações poderiam ser compreendidas como os pedidos de proteção da patente e possuem uma fórmula específica de redação, que deve utilizar a expressão “caracterizado por”, exemplo: Invenção X caracterizada por ser constituída do dispositivo Y.

 

Como é o procedimento perante o INPI?

Após o depósito do pedido formado pelo resumo, relatório descritivo, reivindicações e desenhos (se houver), a invenção fica em sigilo por 18 meses e após esse período ela é publicada na Revista do INPI, que é o diário oficial do instituto. Esse prazo de sigilo é adotado para que o inventor possa eventualmente fazer ajustes na sua invenção antes da publicação ou mesmo negociá-la antes que ela venha a público. Contudo, a publicação pode ser antecipada a pedido do interessado. Após a publicação, o interessado deve requerer o exame da patente no prazo de 36 meses contados da data do depósito. Requerido o exame, é possível solicitar que o pedido receba um trâmite prioritário, como no caso de pessoas físicas, microempreendedores individuais, microempresas e empresas de pequeno porte, o que ajuda a reduzir alguns anos no trâmite do procedimento, de em média 8 anos para cerca de 4 anos ou até menos, a depender das características da invenção e de seu procedimento. Se todos os requisitos estiverem preenchidos, é expedida pelo INPI a carta patente, documento que assegura o exercício do privilégio de exploração daquela determinada invenção. Na hipótese de o INPI indeferir o pedido de patente, há a possibilidade de apresentar recurso administrativo e, persistindo a negativa, pode-se, se o caso, judicializar a questão. Embora o próprio interessado possa iniciar e concluir todo o procedimento do pedido de patente perante o INPI sem a necessidade de um advogado ou consultor, é recomendável que procure um especialista para auxiliá-lo, pois um relatório descritivo mal redigido ou reivindicações inadequadas podem comprometer o resultado ao final do procedimento.

 

Além da patente, quais outros cuidados as empresas podem ter para proteger sua propriedade intelectual?

No campo da propriedade intelectual, é sempre recomendável cuidar também da marca da empresa ou do seu negócio. O procedimento de registro da marca também é feito perante o INPI e é relativamente simples. Aliás, é comum e estratégico conciliar o pedido da patente com o registro da marca, ou da marca com o desenho industrial, ou mesmo somente a marca. No mais, é importante destacar que os gestores e empresários devem cuidar dos ativos intangíveis da empresa tanto quanto cuidam dos ativos tangíveis. Não raro, o know how de determinado negócio vale mais que ele próprio. Por isso, vale ter sempre em mãos um bom contrato de confidencialidade.

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