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Igreja da Boa Morte é memória viva da construção de Limeira

Às vésperas de completar 200 anos, Limeira tem no coração da cidade um símbolo que atravessa gerações: a Igreja de Nossa Senhora da Boa Morte e Assunção. Mais do que um templo religioso, ela representa parte fundamental da história limeirense, preservando memórias de fé, poder, arte e vida social desde o século XIX.

 

Considerada um dos mais importantes patrimônios culturais do município, a igreja nasceu da devoção e também da influência de homens que marcaram a fundação da cidade. Sua origem está diretamente ligada à criação, em 13 de janeiro de 1856, da Irmandade de Nossa Senhora da Boa Morte e Assunção, formada por ricos comerciantes e cafeicultores locais. Entre os fundadores estavam figuras de peso, como o então vigário da Paróquia Nossa Senhora das Dores, Joaquim Franco de Camargo Júnior, além de cidadãos de famílias tradicionais, entre eles Bento Manoel de Barros e o barão de Cascalho, José Ferraz de Campos.

 

Ainda no mesmo ano da fundação, a irmandade solicitou à Câmara Municipal um terreno para a construção de sua igreja própria. A autorização foi concedida e, em 1858, teve início a obra que marcaria definitivamente o centro urbano de Limeira. As primeiras paredes foram erguidas em taipa de pilão, com o apoio de mão de obra escravizada, sob responsabilidade do barão de Cascalho. Mais tarde, Bento Manoel de Barros assumiu a obra e trouxe ao município o arquiteto florentino Aurélio Civatti, responsável por refinar o traçado arquitetônico e coordenar os trabalhos de acabamento, incluindo talhas douradas e pinturas.

 

A imponência do templo não tardou a impressionar a sociedade da época. Em 1864, jornais já destacavam sua grandiosidade, descrevendo a boa disposição do coro, os espaços para altares e sacristias, além dos sinos que se tornariam marcos sonoros da cidade. Em abril de 1867, a instalação dos sinos foi celebrada com pompa, música e intensa participação popular. No ano seguinte, em agosto de 1868, as festividades religiosas marcaram oficialmente a inauguração do templo, com missas solenes, procissões e a entrega das imagens vindas de Portugal.

 

A Igreja da Boa Morte se destacou não apenas pela religiosidade, mas também pela importância social. Ali se desenvolveram ações de assistência, educação e saúde, como a gênese da Santa Casa de Misericórdia de Limeira. Durante o surto de febre amarela de 1892, o espaço funcionou como hospital de emergência, reafirmando o papel solidário da confraria que a administra até hoje.

 

No século XX, o templo passou por reformas e modernizações, como a instalação de pisos em mármore, pinturas artísticas e até mesmo a criação de uma escola, a Escola Mista Nossa Senhora da Assunção, que funcionou no andar superior a partir de 1917, atendendo crianças de diferentes camadas sociais. Também foi palco de manifestações culturais, como o ensino do catecismo e a organização de festas populares.

 

A relevância da Igreja da Boa Morte ultrapassou fronteiras locais. Em 1886, o imperador dom Pedro II e a imperatriz Tereza Cristina visitaram o templo, reforçando seu prestígio em nível nacional. Mais de uma vez, ela também foi elevada ao posto de Matriz Provisória de Limeira, substituindo a Igreja de Nossa Senhora das Dores em períodos de reconstrução.

 

Além de sua arquitetura, a igreja preserva um valioso acervo sacro, que inclui imagens religiosas do século XIX, pratarias, talhas e sinos centenários. Entre as obras de destaque, estão esculturas atribuídas a Miguelzinho Dutra, renomado artista ituano, e peças trazidas diretamente de Portugal, que integram o patrimônio artístico e religioso da cidade.

 

Em 2016, a importância histórica e cultural do templo foi reconhecida oficialmente com o tombamento pelo município, por meio da Lei nº 375. A medida garantiu não apenas a preservação do prédio, mas também de seus bens móveis e integrados, assegurando que futuras gerações possam conhecer de perto este capítulo da história limeirense.

 

Atualmente, a Igreja da Boa Morte passa por um processo de restauração autorizado pelo Condephali (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico de Limeira). O objetivo é preservar sua estrutura, garantindo a integridade de sua arquitetura e de seus bens artísticos.

 

Mesmo com o peso dos séculos, a vida em torno da igreja permanece vibrante. A Confraria de Nossa Senhora da Boa Morte e Assunção segue ativa e, todos os anos, promove a tradicional festa no mês de agosto, coincidindo com a celebração católica da Assunção de Maria. O evento, conhecido como “Vem pro Largo”, reúne fiéis, devotos e comunidade em momentos de fé, cultura e confraternização.

 

Com informações do Guia Patrimônio Cultural de Limeira, de autoria de João Paulo Berto (org), Beatriz Salviato Claudiano, Franciellen Taboga, Kezia Caroline Fagundes Dias e Jorge Luis dos Santos.

 

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