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“Indulto é competência do presidente”, diz Ives Gandra

O jurista e professor emérito do Mackenzie, Ives Gandra Martins, afirmou nesta semana que a decisão do presidente Jair Bolsonaro de conceder indulto penal ao deputado federal Daniel Silveira é uma competência absoluta e não cabe questionamentos do Supremo Tribunal Federal (STF). Em um vídeo, divulgado pela Jovem Pan, ele diz que por se tratar de uma decisão que cabe exclusivamente ao Executivo, não é possível discutir ou revogar o perdão. “Onde diz que é uma competência absoluta não pode o Supremo dizer se pode conceder [o indulto] nessa ou naquela ocasião”, afirmou o jurista, reforçando o “poder absoluto do presidente” e comparando a decisão de Bolsonaro com a de Michel Temer, que concedeu o perdão a condenados pela Lava Jato.

Em julgamento de 2018 no STF, o ministro Alexandre de Moraes defendeu o indulto como prerrogativa do presidente: “Essa questão do ato de clemência constitucional é privativo do presidente da República. Podemos gostar ou não. Assim como vários parlamentares não gostam quando o STF declara inconstitucionalidade de emendas ou leis. É função constitucional prevista para o Supremo, assim como o indulto não é uma ilícita ingerência do Executivo. Essa graça ou perdão não faz parte da política criminal porque é um mecanismo de exceção.  É competência da presidência entender excessos da política criminal, genericamente prevista pelo legislativo e concretamente aplicada pelo judiciário”.

CONDENAÇÃO

O STF condenou na última quarta-feira o deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ) pelos crimes de tentativa de impedir o livre exercício dos poderes e coação em processo judicial. Ele foi condenado a oito anos e nove meses de reclusão, inicialmente, em regime fechado, à perda do mandato de deputado federal à suspensão dos seus direitos políticos. Ao todo, 10 dos 11 ministros votaram pela condenação do parlamentar. Apesar da condenação, especialistas disseram à BBC Brasil que Daniel Silveira não será preso e nem perderá o mandato automaticamente porque ainda cabe recurso da decisão.

Silveira era acusado pela Procuradoria Geral da República (PGR) pelos crimes de coação (uso de força) no curso de um processo judicial, incitação à animosidade entre as Forças Armadas e o STF e por tentativa de impedir o livre exercício dos Poderes da União. Os crimes aconteceram entre 2020 e 2021 quando ele divulgou vídeos em redes sociais atacando o STF, defendendo uma intervenção militar e ofendendo pessoalmente membros da Corte.

Já o professor de direito da Universidade de São Paulo (USP) Rafael Mafei é um dos juristas que criticaram a decisão. Ele disse à BBC que a fala de Silveira é "inaceitável", mas vê uma série de problemas jurídicos na decisão, como o fato de a prisão ter sido determinada dentro do Inquérito das Fake News.

Para ele, medidas menos drásticas poderiam ser adotadas no caso, como determinar a retirada do vídeo da internet, por exemplo.

DEFESA

A defesa de Silveira disse em nota à imprensa que "a prisão do deputado representa não apenas um violento ataque à sua imunidade material - referência à proteção que a Constituição garante aos parlamentares para expressar suas opiniões - mas também ao próprio exercício do direito à liberdade de expressão e aos princípios basilares que regem o processo penal brasileiro".

A GRAÇA

O presidente Jair Bolsonaro editou um decreto na última quinta-feira para perdoar quaisquer penas aplicadas contra Silveira. Trata-se da graça constitucional, que significará a absolvição das penas estabelecidas pelo Supremo e o impedimento ao cumprimento da condenação. Em seu discurso Bolsonaro disse que "vai ser cumprido" e que o instrumento foi concedido com base em "decisões do próprio senhor Alexandre de Moraes".

Apesar de admirar o amigo Luís Roberto Barroso, que votou pela condenação do deputado, o jurista Gandra garante que a decisão do presidente Bolsonaro está amparada pela Constituição.

“Se o presidente tem o poder absoluto de fazer, sem precisar dar justificativa do que fez, indiscutivelmente é uma competência que dele tem e pode exercer da forma que quiser”. Ele afirma ainda que a decisão de Bolsonaro – e a motivação – não é, de forma alguma, caracterizada como desvio de finalidade ou abuso de poder. “O indulto é uma tradição do Direito Mundial que sempre se adotou no passado. O monarca, o rei, o impedir, o faraó, tinham o direito de dar indulto, que era um poder absoluto”.

Ele ainda pontua três pontos principais dos indultos penais.  “Primeiro: pode ser concedido a qualquer momento. Segundo lugar: não tem limitação e terceiro lugar, pode ser concedido em processos ainda em tramitação”, completou, reforçando a decisão “não se discute”. 

FORÇAS ARMADAS

Contestando ainda Barroso, Gandra disse que a invasão de competência é extremamente perigosa e avaliou a possibilidade de um conflito entre o poder Executivo e o Judiciário, caso haja um impasse em torno do entendimento. Segundo ele, caso o conflito seja evidente, caberia às Forças Armadas, para estabelecer a ordem jurídica, a definição de determinar, ou não, a prisão do deputado federal. “Se o presidente recorresse, ele não poderia comandar as Forças Armadas, não poderia ser o ministro da Defesa. Mas, as Forças Armadas, que é uma instituição do Estado, iria para repor só esse ponto e diria: o deputado não poderá ser preso. Sem destituição do poder, sem tirar competência nenhuma dos poderes”, acrescentou, apesar de estar convencido de que “não vamos chegar a esse ponto”.

Em outra ocasião, ainda sobre o assunto, o jurista menciona que sem a devida autorização, “não poderia mandar prender, por manifestação, um deputado, que é inviolado em suas manifestações. Isso, a meu ver, pode representar cerceamento da livre expressão dos deputados”.

Por mais de uma vez, Ives Gandra deixou claro quis deixar claro “não concordar em nada” com o que foi dito pelo deputado, mas acrescentou que a Constituição dá ao parlamentar “liberdade plena” para se expressar.

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