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Dia do Professor: profissão está entre as que mais impactam no futuro

Hoje é comemorado o Dia do Professor, data instituída em 1963, durante o governo de João Goulart como forma de homenagear os profissionais encarregados do ensino de crianças, jovens e adultos em todo o país. Mais do que uma comemoração, a data provoca reflexões sobre uma das profissões que mais impactam no futuro da sociedade. Márcio Bergamini, professor de língua portuguesa do Colégio Portal de Limeira, Coordenador da Escola Estadual Margarida Paroli e secretário da Associação Limeirense de Escolas Particulares (Alep), fala à Gazeta sobre a importância da data e da profissão.

 

Qual é o significado dessa data para vocês, professores?

É um momento de orgulho e reflexão sobre a profissão que escolhemos. Ao mesmo tempo que recebemos o carinho dos alunos e suas famílias, refletimos sobre os desafios que enfrentamos, como a falta de valorização da profissão, o excesso de carga de trabalho e, principalmente, sobre como podemos, enquanto uma classe profissional, mudar esses aspectos para que a profissão volte a ser atrativa aos olhos de todos. A data é uma comemoração e não pode ser romantizada. É o momento que temos para falar, refletir, apresentar propostas e esperamos ser ouvidos.

 

Quais são esses desafios?

Começam pela formação profissional: muitos cursos de licenciatura e boa parte dos cursos de pedagogia oferecem uma formação desvinculada da realidade das escolas. Fala-se muito em teorias, em técnicas, e pouco se pisa na escola. Raros cursos fazem isso. Muitos mantêm, ainda, um carácter academicista, tradicional. Não se alinham às necessidades das novas gerações e acabamos por reproduzir um tradicionalismo sem fim, com a impressão de que isso é que faz uma escola.

Outros desafios estão ligados à carreira. O professor trabalha em excesso: de dia, de noite, de madrugada, aos finais de semana. No Brasil, com exceção de alguns estados que têm investido nisso, as remunerações da carreira estão entre as mais baixas do mundo, o que obriga o professor a procurar diferentes escolas, a se dividir entre a rede pública e privada, por exemplo, para conseguir renda. O trabalho não se restringe à sala de aula. Ele acontece antes, com preparo, com estudos, e depois, com correção de atividades, revisões, mais preparo. Essa parte exaustiva de bastidores quase ninguém percebe e são raros os que valorizam.

Há, ainda, questões ligadas à realidade das diferentes redes de ensino, como o ensino remoto, plataformas digitais, condições de segurança, infraestrutura, superlotação de salas em alguns casos, além da limitação de políticas de carreira no caso da rede pública.

Há o grande desafio do diálogo entre gerações. Temos uma escola do século XIX, com professores do século XX, ensinando alunos do século XXI. É uma loucura!

 

A pandemia piorou isso?

Não diria que piorou. Ela nos abriu os olhos sobre necessidades que demonstrávamos ter e que procurávamos ignorar. Alguns teóricos já apontavam para elas há décadas, mas não lhes demos ouvido. O ensino híbrido, por exemplo, é uma realidade em muitos países desenvolvidos. O uso da tecnologia, o emprego de diferentes metodologias, a personalização da aprendizagem. Os professores precisaram aprender, da noite para o dia, a encarar o computador – acredite, muitos ainda têm medo dele! Foram obrigados a superar o medo: usam câmeras, editam vídeos, preparam materiais digitais, exploram... A pandemia trouxe o agito que precisávamos para entender que a educação precisa mudar, que nós precisamos mudar e evoluir no ritmo do mundo, das tecnologias. Nossos alunos operam bem a tecnologia, mas não a utilizam de forma produtiva para aprender. Cabe a nós instruí-los quanto a isso. Há possibilidades infinitas! Por que não aprendermos uns com os outros? O fato é que ficamos parados por muito tempo, confortáveis no meio de nossas apostilas e materiais prontos, nas aulas expositivas e enfadonhas. Agora nos cabe construir o avião em pleno voo!

 

Quais são os caminhos para o futuro da profissão?

O professor é a profissão de todos os futuros, como anuncia o slogam de uma instituição de formação de professores, em Campinas. Médicos, engenheiros, cozinheiros, jardineiros, youtubers, influencers, todos passam pelo professor. Em uma sociedade cada vez mais carregada de informação, cada vez mais entranhada pelos meios de comunicação e pela tecnologia, cabe ao professor ensinar os caminhos para lidar com tudo isso.

Nós, professores, já não somos os detentores da informação. Ela está nos livros, na rede, no Youtube, muitas vezes em uma linguagem mais acessível e atrativa para os alunos do que aquilo que falamos em sala. Mas, diferente dos alunos, nós sabemos separar o bom conteúdo do conteúdo duvidoso. É isso que precisamos ensinar: a análise, a crítica, a seleção. O papel do professor muda, nesse sentido. Ele passa a ser um curador de conteúdo, um provocador de situações problemas para que os alunos resolvam e possam mobilizar as informações na elaboração dos saberes que vão constituir as ciências e modificar a realidade. Com isso, os alunos vão construindo competências para o futuro.

As empresas, das tradicionais às startups, estão olhando para profissionais com essas competências e a escola precisa entender que já não pode mais ficar presa ao tradicionalismo que obriga os alunos a decorar conteúdos. Se quisermos profissionais com essas competências no futuro, já estamos atrasados na formação deles.

Por isso a profissão de professor também muda. A formação docente, principalmente, precisa olhar para isso e se alinhar a essas demandas. O profissional docente que conceber seu trabalho dentro do que chamamos de paradigma da comunicação, em educação, será muito requisitado pelo mercado.

 

É por isso que você a considera a profissão das profissões?

Por isso e muito mais! Nós precisamos de bons professores, no presente e no futuro. Sempre precisaremos. E isso mantém a esperança de que a profissão será valorizada como se deve, e de que os profissionais que a escolherem o façam pelo desfio e por um propósito de vida. Hoje, me entristece muito saber que alguns a veem como um “bico”, um plano B. A docência precisa ser o plano A do indivíduo que a deseja.

Deve ser exercida com responsabilidade, com curiosidade, com a humildade de quem sempre está aprendendo e sabe que sempre há mais por aprender. Já disse isso uma vez: o professor precisa ser, antes de tudo, um curioso, não só sobre sua área, mas sobre a cognição humana, sobre as formas de aprender, sobre o pensamento, sobre todas as áreas. E precisa, principalmente, aprender a desaparecer.

Essa ideia é de um filósofo francês chamado Michel Onfray: o bom professor sabe que desaparece, que é finito, e prepara seus alunos para que não dependam dele. E eu acrescento, quase contrariando: o bom professor não desaparece nunca.  Ele vive no coração, na carreira, no pensamento dos seus alunos. Eu carrego comigo todos os bons professores que tive. E os maus também – para não ser como eles! Isso é romantizar a profissão? Talvez, se pensar assim apenas por paixão ou idealismo ingênuos. Há muita ciência nesse pensamento, no entanto.

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